quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Quando eles se perderam




Foi um encontro inesperado. Num ponto de ônibus qualquer. Numa tarde de vento frio. Ela estava com a cabeça levemente inclinada para a direita, pensando e esperando... o ônibus, a felicidade, algum sorriso, qualquer coisa que tirasse de seu rosto as marcas de uma letárgica tristeza.

Ele caminhava tranquilamente, cabeça erguida, pensamentos sombrios quando ávidos olhos verdes pousaram nela. Só então percebeu o quanto sentira-se sozinho sem ela por perto. 

Aproximou-se lentamente, bebendo a beleza madura em que ela se transformara, havia se passado dois anos desde a última vez em que se viram. Dois anos em que decidiu partir, sem adeus e explicações. 

O vento soprou com força os cabelos dela, ainda mais longos do que se lembrava, inalou o sútil perfume do xampu que tanto gostava e quase gemeu de saudade do gosto dela, do cheiro dela. Dela!

Distraída, ela não o viu se aproximar, apenas sentiu uma mão forte e quente pousar em seu ombro esquerdo carinhosamente, virou-se assustada e naquele instante, seu coração parou uma batida, ele, o motivo de seu tormento e infelicidade estava em sua frente, estupidamente ainda mais belo, o verde dos olhos brilhavam como esmeraldas, a boca deliciosamente desenhada ousou um sorriso discreto. Mas ela não queria sorrir, o sorriso a abandonara a exatos dois anos, não ousaria sorrir pra ele, ele... que levou seu coração, seu sorriso, deixando apenas lágrimas e solidão.

Engoliu toda a dor e a mágoa, o olhou com exasperada frieza antes de lhe dizer um "Oi" quase inaudível e sem emoção. Foi com inesperada surpresa que sentiu os braços dele a apertarem em um abraço caloroso seguido de um beijo estalado em seu rosto. O seu corpo traidor queimou de desejo e saudade. Suspirou ruidosamente tentando encontrar a voz, foi ele que quebrou o silêncio, assim como tinha sido ele a quebrar seu coração.


 _ Eu não sei o que dizer. Tanto tempo se passou, tantas coisas aconteceram. Mas eu estou realmente contente em te reencontrar. _ Disse com uma sinceridade difícil de ser inventada.

  
Ela o ouviu. Ela o sentiu. Mas ela não iria fingir um contentamento.

_ Então simplesmente não diga nada. Foi isso que você fez quando decidiu partir._ A voz sardônica cortou o silêncio, sangrando um coração culpado.

Ele fechou os olhos por segundos, apertando com força, engolindo a culpa, desejando voltar no tempo e fazer a coisa certa. E a coisa certa era ter ficado com ela, pra sempre. Entendia a sua raiva e decepção. Mas ele a queria de volta, queria a felicidade que estupidamente desperdiçou.

_ Talvez você não acredite... _ dizia ele com a voz embargada. _ ... nós éramos errados um pro outro, você queria romance e eu alguém pra curtir, achei melhor partir sem despedidas. Mas minha vida tornou-se vazia sem você. Eu me tornei vazio, sem você. Pensei que estava fazendo o certo em te deixar pra que você encontrasse a pessoa certa. Te encontrar hoje foi como se eu tivesse uma segunda chance pra reparar meus erros e te pedir pra voltar pra minha vida, deixa eu fazer diferente dessa vez, deixa eu te mostrar que posso ser o homem que você procura e precisa. Deixa eu ser o seu romance. _ A voz soou com apelo e desespero.

O tempo parou...

Ela o ouviu em silêncio, todas aquelas palavras que um dia sonhou ouvir agora perdiam o significado, o amava ainda, apesar do tempo e de todo sofrimento, o amava. Mas não podia guerrear uma luta perdida, ele estava ali em sua frente, falando palavras bonitas, mas a verdade era que se ele a quisesse realmente, teria procurado por ela, dois anos era muito tempo de espera, provavelmente vivera tudo o que podia com outras mulheres, outras bocas e outros corpos, até perceber o quão vazio era voltar pra uma cama fria e uma casa vazia, sem um amor verdadeiro. Viver de luxúria devia tê-lo cansado e agora procurava nela o sossego que seu corpo sempre lhe oferecia, até ele se cansar da calmaria e procurar tempestades em outros mares. 

O olhou demoradamente, gravando na mente aquele amor perdido, tomou seu coração de volta com fúria velada nos olhos. E uma lágrima, apenas uma lágrima rolou de seu olho, contornado o rosto e molhando os lábios. 

Uma lágrima. 

E ele percebeu que não haveria mais uma segunda chance. Que não a teria mais em sua vida. Aquela única lágrima decidiu a sua história.


Ela respirou profundamente, a brisa soprou-lhe os lábios como um último beijo não dado. Quando ela falou parecia resignada a abraçar a solidão.


_ Eu não posso voltar pra alguém que eu sei que partirá sem aviso assim que se sentir preenchido pela minha presença novamente. Eu não posso mais acreditar em suas palavras vazias e em seu coração traiçoeiro. Eu não posso mais viver de mentiras e de incertezas. Eu não posso sentir o calor de seu corpo e a frieza de seus sentimentos. Você sempre fez suas escolhas, agora é hora de conviver com elas!

Ele queria pegar ela pelos ombros e sacudir até que entendesse suas verdades e seu amor, retirar de seus olhos aquele véu escuro de ressentimento e de esperanças fracassadas, mas apenas abaixou a cabeça, temendo soar sua fraqueza e medo.


 _ Você sabe que eu sempre costumo fazer as escolhas erradas!

 _ O que eu sei é que de todas as suas escolhas, você nunca me escolheu.


O ônibus chegou na hora certa, antes que ele pudesse lhe convencer a ficar. Ele ainda a segurou pelo braço na ânsia de evitar sua partida, não conseguiu! Nos olhos um clamor mudo e desesperado. 

Implorou em silêncio contido. Doído.

Ela o olhou pela última vez, detalhadamente, um grito de dor preso na garganta. Balbuciou um "adeus" e partiu. Não olhou pra trás, talvez se tivesse olhado, teria visto o homem que nunca chorava derramando lágrimas derrotadas e unindo os lábios em uma pronuncia silenciosa, desejando gritar sua declaração de amor. "Eu te Amo". Dissera ele em sua angústia contida.


Ela sentou e chorou, nos lábios apenas o sussurro de seu amor. "Eu te Amo". Dissera ela em uma súplica iludida.

A boca disse adeus, mas o coração se calou.

E dois corações se perderam, com as recordações certas, as lembranças certas, os beijos certos. 

Dois corações certos, perdidos para amores errados. 

_ Rosi Rosa 

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