sábado, 4 de outubro de 2014

Nosso amor ainda não acabou.‏



Caminhei sem pressa por uma estradinha de pedras e flores, uma lágrima escorreu, molhou meus lábios, senti o gosto salgado de dor. 

Dor.

Fechei os olhos rapidamente. 

Parei. 

Respirei profundamente. 

Inclinei a cabeça e deixei que o vento secasse minhas lágrimas, deixei que o fraco sol aquecesse a minha pele fria e pálida.
Resmunguei baixinho.

Continuei andando com calma.

O coração batia apressado. As lágrimas voltavam com força, escorrendo pelo meu rosto inteiro. Minhas pernas fraquejaram. Apoiei em uma árvore e dali fiquei observando, pessoas choravam alto, outras apenas balançavam a cabeça em um silêncio doloroso, contido. Algumas se apoiavam em abraços apertados, outras choravam em ombros reconfortantes. Eu estava sozinha em minha dor. A distância eu vi você descer pelo sepulcro lentamente. Vi a terra cobrir o caixão. Vi as flores sendo jogadas. Ouvi preces. Choros. Gritos e descontrole. A distância, eu senti revolta por te perder... por me perder...

Foram muitos minutos de uma despedida barulhenta. Muitas lágrimas. Muitos 'adeus'. E eu, estava ali, apoiada naquela árvore, esperando o meu momento de te dizer 'adeus'. Sozinha. Pra sempre. 

Um a um foram partindo, te deixando, te lembrando, te esquecendo. 

Eu esperei pacientemente. Eu chorei tantas vezes, quis gritar, correr, fugir... mas, lá estava, parada no mesmo lugar.

 Esperando... Sentindo... Morrendo. 

Quando a última pessoa se foi, eu quase corri pra 'você', andei apressadamente, em pé, fixei meu olhar pra baixo, para o monte de terra que te cobria, para as inúmeras flores que adornavam o lugar. 

Tudo tão mórbido. Tão triste. Tão sepulcralmente perfumado.
Ajoelhei, alisei a lápide, com a ponta dos dedos desenhei seu nome escrito na pedra fria do mármore. Não havia dizeres escritos, apenas seu nome e datas. Nada mais. Não era preciso. Foquei nas datas, nascimento e morte, tão cedo  pra partir, tão novo pra morrer. 

Deixei que as lágrimas escorressem de meus olhos livremente. Deixei que os gemidos de dor escapassem de meus lábios facilmente. Deixei gritos ecoar pela solidão do cemitério vazio e frio. 

Deixei meu coração doer, sufocar, morrer. De novo. E de novo.


— Ei. — Minha voz saiu rouca, baixa, molhada. — Estou aqui...  — Minha voz falhou, as lágrimas sufocavam. — ... para me despedir de você. Eu não quis tá presente quando todos ainda estavam aqui, não quis que vissem meu sofrimento, não quis que escutassem minhas palavras. Eu queria estar sozinha, digo, apenas com você. Pode me ouvir? Pode? — Apertei os olhos com força, estava ficando louca, estava implorando por atenção de alguém que não estava mais presente, que não estava mais... vivo. 


O vento soprou mais forte, fustigando a minha  pele, bagunçando os meus cabelos. 


— Eu queria ter dito tanta coisa... queria ter te falado da beleza dos meus sentimentos e agora tudo o que me resta é a parte feia da minha raiva, da minha dor, da minha fúria. Por quê? POR QUÊ? — O grito agudo assustou os pássaros que revoaram pra longe daquela agonia rasgante. 


— Eu odiei cada segundo as piadas que você me contava, não achava graça, meu riso era falso só pra você não ficar chateado comigo... e o que eu não daria pra ouvir novamente suas piadas ridículas, dessa vez eu riria, juro que seria um riso verdadeiro. Juro!

 Mais lágrimas. Mais dor. Mais arrependimentos. 


— Eu sentia saudades nos dias em que não nos víamos. Disfarçava lendo livros, ouvindo músicas... mas era você... sempre era você que aparecia nas páginas do livro ou nas notas das músicas. Eu discava seu número inúmeras vezes, nunca ia até o fim, não queria demonstrar que você era a minha fraqueza, o meu amor. Não quis te amar. Não quero te amar. NÃO. — Sacudi a cabeça com violência, com desespero. 

Negando o amor. Negando o amado. 
Negando a morte. 


— Se eu soubesse... — Minha  respiração estava ofegante, doía respirar. Doía viver agora. — Se eu soubesse que aquele dia seria o último, o último abraço, o último beijo, a última vez em que tocaria a sua pele quente, a última vez que ouviria sua voz sussurrada em meu ouvido falando meu nome com malícia, eu teria... feito diferente? Eu não sei, foi tudo tão perfeito, tão único, tão nós. Hoje, só há um de nós. Só... Você. Eu... Morto... Vivo. 


— Eu nunca quis te amar, mas te amei com toda a força da minha alma. E agora? O que eu faço com essa vida vazia que ficou? O que eu faço da minha vida sem você? O que eu faço sem você? — Com os punhos fechados, socando a terra, as flores, chorei ruidosamente. Lentamente levantei-me, sacudi a terra dos meus joelhos, deixei as lágrimas caírem grosseiramente sobre a lápide, deixei meu coração ali enterrado junto com o meu amor. Deixei um pouquinho do meu passado, uma boa parte do meu presente e o meu futuro quase intocado enterrados ali com ele. 

Eu não levei flores, eu levei meu coração, minha alma, minha vida, meu amor, minhas lágrimas. Eu levei meu último suspiro, meu último beijo, minha triste despedida.


— Nosso amor ainda não acabou. — Falei entre dentes cerrados, tentando não gritar minha dor novamente. — Não acabou... 


Fui embora prometendo voltar. Prometendo ficar. Prometendo te  amar... pra sempre!


— Rosi Rosa.